LeWary LeWary  • 21.10.13 18:11

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Bullying, relação distante com os pais e isolamento social podem estar na origem do ataque levado a cabo por jovem de 15 anos na escola de Massamá. Ninguém deu pelos sinais de alerta.
Introvertido, de poucas falas e poucos amigos, Gonçalo dava sinais de perturbação que ninguém levou a sério. Os avisos de que se preparava para comprar “armas e bombas” foram desvalorizados pelos colegas. As agressões – a um colega a quem espetou um lápis nas costas e a um professor a quem tentou acertar com uma pedra – não deram sequer origem a processos disciplinares na escola.

“A própria mãe sempre pensou que isto só acontecia aos outros”, assume ao SOL Pedro Proença, advogado do jovem de 15 anos que na passada segunda-feira esfaqueou três colegas e uma funcionária na Escola Stuart Carvalhais, em Massamá (Sintra).

Dez minutos depois de começar a aula de Português, Gonçalo levantou-se e atirou uma bomba de fumo. Lançada a confusão, agarrou numa faca de cerâmica e começou a atacar todos os que lhe fizeram frente. Até esse momento, os colegas nunca acreditaram que as ameaças que fazia há semanas se concretizassem.

Na verdade, Gonçalo tinha um croqui onde esboçava todo o ataque. Numa folha A4, o jovem assumia a vontade de matar pelo menos 60 pessoas e anotara uma lista do material de que precisaria para levar o seu plano avante: facas, fumos, bombas caseiras, gás pimenta, um bastão, gasolina, álcool, fósforos, isqueiro e uma espingarda.

Uma família absolutamente normal

Na sua mochila, a Polícia encontrou apenas duas facas, um spray de gás pimenta, dois frascos de álcool e dois isqueiros. “Acho caricato especular-se que ele faria um genocídio com este material”, desvaloriza o advogado do jovem. Perante o juiz que o ouviu, esta terça-feira, Gonçalo fez um discurso de revolta: assumiu “uma grande insatisfação com os valores da sociedade e uma relação com os pais que não o satisfazia”.

Pedro Proença descreve a família como sendo “perfeitamente normal, de classe média-alta, de pais com formação superior: um técnico de radiologia e uma assistente num consultório médico”. Mas sublinha o facto de Gonçalo se sentir “incompreendido e só” em casa e “estigmatizado pelos colegas”.

Na escola, Gonçalo estava farto de ser chamado “queque e copinho de leite”. Seria um aluno mediano, em termos de aproveitamento escolar, que nunca se conseguiu integrar na escola para onde foi depois de ter feito o 1.º ciclo num colégio privado e o 2.º ciclo já no ensino público, na D. Pedro IV, em Monte Abraão.

Perante o juiz, que decretou o seu internamento compulsivo por três meses num centro educativo, sem direito a visitas nas primeiras duas semanas, Gonçalo disse que se sentia “arrependido” e afirmou estar “com uma depressão”.

Margarida Gaspar de Matos, psicóloga especialista na adolescência não estranha. “Seria mesmo uma grande excepção este insólito facto ocorrer ‘como uma ilha’ na vida de um jovem de 15 anos que até esse dia tivesse tido uma família aceitante e presente, uma escola integradora e implicada, e uma perspectiva de um qualquer futuro bonzinho” – comenta a especialista, que vê estes episódios como o culminar da “trajectória de ruptura” dos adolescentes.

Álvaro de Carvalho, psiquiatra especializado na adolescência, alerta, porém, para o facto de nem sempre os sinais dados serem claros. “Alguns jovens que não dão problemas, são bons alunos e são vistos como certinhos, não estão de boa saúde mental”, adverte, explicando que a rebeldia faz parte de uma adolescência saudável. “Fico mais preocupado quando me dizem que o adolescente é muito tranquilo”, admite Álvaro de Carvalho.

Introvertido e sem amigos

No caso de Gonçalo, apesar de alguns episódios de mau comportamento na escola – que nunca deram origem a processos disciplinares –, era descrito como alguém “calado, um nerd dos computadores, que se isolava” e não tinha o hábito de sair à noite.

De resto, o facto de não ter muitos amigos e de ser filho único pode ter agravado o seu quadro mental. “Os pais muitas vezes deixam os filhos muito sozinhos. É preciso dar-lhes atenção e manter o diálogo. Perceber o que andam a fazer e por que é que não trazem amigos para casa ou não são convidados para sair”, alerta o psiquiatra.

“Há miúdos que vão acumulando uma situação de mal-estar, que explode por um gatilho qualquer”, comenta José Morgado, professor do ISPA (Instituto Superior de Psicologia Aplicada). A reacção pode passar por uma atitude de agressividade como a de Gonçalo ou por “picos de adrenalina, como andar de carro em contramão ou desafiar os carros numa mota ou até o suicídio”.

Se Gonçalo foi, de facto, alvo do gozo dos colegas “de forma repetida e intencional”, então era uma vítima de bullying, conclui Melanie Tavares, do Gabinete de Apoio ao Aluno e à Família do IAC (Instituto de Apoio à Criança). “Nos casos mais mediáticos de tiroteios nos Estados Unidos, percebe-se que quase sempre o agressor foi antes vítima”, aponta a especialista, explicando que essa reacção tem que ver com “a incapacidade de gerir as emoções”.

“Pode acontecer que, após anos de vitimização, o jovem torna-se ‘um provocador’, até como estratégia de defesa”, admite Margarida Gaspar de Matos, que frisa, contudo, o facto de haver uma diminuição dos casos de bullying. “Entre 2002 e 2010, a violência interpessoal nas suas várias formas diminuiu em Portugal e na Europa”, sublinha a psicóloga, admitindo que a crise possa inverter estes números. “Não estou tão confiante no que vão ser os meus dados de 2014”, diz.

“Não acontece na maioria dos casos, mas por vezes dá-se uma inversão de papéis entre vítima e agressor”, assume Susana Carvalhosa, investigadora no ISCTE com trabalhos na área do bullying. A professora de Psicologia Social admite que a crise está a fazer com que haja cada vez menos recursos na escola para dar apoio a estes casos. “Há um desinvestimento na educação integral dos jovens”.

Mas Melanie Tavares frisa os bons resultados que têm tido todas as acções contra a violência realizadas nas escolas. “Sempre que são feitas, são muito eficazes” – garante, adiantando que o IAC está disponível para ajudar a Stuart Carvalhais a dar apoio aos seus alunos para lidar com este caso.

Contactada pelo SOL, a direcção da escola de Massamá não quis fazer comentários sobre o caso, nem explicar que plano tem para apoiar os que foram vítimas do ataque. Os três alunos e a funcionária feridos por Gonçalo estão fora de perigo.

Internamento pode ser prolongado

Até agora, o jovem não tinha qualquer apoio psicológico. Agora, internado, vai ser seguido por uma equipa multidisciplinar da qual farão parte psiquiatras que lhe irão traçar um perfil psicológico para entender o que esteve na origem do seu comportamento.

Ao fim dos 90 dias de internamento agora decretados, o juiz irá reavaliar o caso e o jovem pode mesmo ficar institucionalizado durante mais tempo.

“Dificilmente voltará à vida normal no médio prazo”, admite o seu advogado, que acredita na sua reabilitação. “Com a inteligência e as capacidades que tem, se for devidamente acompanhado pode canalizar a sua insatisfação num sentido mais positivo."

Créditos:
SOL
Margarida Davim

Anonymous Convidado  • 10.11.13 3:24

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